Débora de Oliveira

Quem sou eu

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Eu sou aquela que espera vocês todos os dias no campinho, lugar onde sou mais feliz. Onde me sinto realizada e onde vejo que todo esforço valeu muito a pena. E não foram poucos os sacrifícios.

E sabe porque eu sigo aqui?!? Eu nunca entendi que futebol era coisa de homens. Eu cresci nos campos, em meio às famílias, brincando na tela e tomando a bebida do intervalo.

As esposas dos jogadores cuidavam de mim enquanto meu pai jogava, elas sempre estavam lá com a cadeira de praia e o chimarrão a postos no domingo de qualquer tempo e temperatura.

Em meio às brigas e foguetórios e rivalidade de bairro, nunca ninguém disse que nos não deveríamos estar lá. Éramos parte fundamental da festa da bola.

Minha primeira referencia de mulher no futebol se chamava Mercides. Ela era nossa vizinha do lado no Jardim Maua, em Novo Hamburgo. Éramos como se fosse da mesma família, já que quando meu pai nasceu minha avó não teve leite para amamenta-lo e como ela teve um filho da mesma idade, dava de mama para os dois.Mercides lavava os uniformes do Botafogo, time do bairro onde entendi o que era vitória, o que eram os ídolos, o que era a paixão pela bola.

Tenho nas melhores lembranças o varal dela todinho em preto e branco, as camisas lado a lado listradas, os calções pretos, as meias brancas uma a uma em cada prendedor, tremulando pelos ares do pátio de areia pura.

Ela lavava os uniformes cantando os hinos do Bota no tanque de cimento, e tinha um só dela, uniforme certeiro de todos os domingos onde ela era a madrinha do time.

Eu lembro a voz dela direitinho cantando: “é o Botafogo que vem chegando, todos cantando com alegria, o futebol vem da pelota, e o carnaval vem da folia…”.

Aos que ainda não entendem nossa participação: Desculpem não entendermos nós que esse não era o nosso mundo. Foi difícil perceber que esse universo não era de todos.

O que desbravamos nesse meio tempo não foi para desafiá-los, foi para festejarmos juntos as alegrias do esporte.

Tudo começa com ELA, A bola. É atrás dela que eles correm. E ela sendo ela, somos nós.

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